Lanna Bittencourt: Estrela da Era de Ouro do Rádio

Lana Bittencourt marcou época na música brasileira com sua voz intensa e interpretação apaixonada. Conhecida como “A Internacional”, foi uma das vozes femininas mais marcantes do Brasil nos anos 1950 e 1960, transitando com elegância entre o rádio, a televisão e os palcos internacionais.

Filha de um militar que também era poeta e compositor, Lana teve apoio da família para a carreira artística. Sua avó italiana, por exemplo, a incentivou a estudar canto lírico desde cedo. 

O início inusitado: do jingle à consagração

Pouca gente sabe, mas o primeiro passo de Lana Bittencourt rumo à fama teve início graças a um jingle publicitário — um detalhe curioso e pouco conhecido até mesmo por seus admiradores mais atentos. Em 1956, a Radiolândia revelou essa história singular: o pai de Lana era sócio da empresa Rodoviária Estrela do Norte Ltda., especializada no transporte de cargas e com uma crescente atuação em diversas regiões do país.

Fundada em 1951, a empresa já apresentava bons resultados em 1952, e para ampliar sua clientela, decidiu investir em uma campanha publicitária. Como parte da ação, foi encomendada à RCA Victor a gravação de um jingle — que acabou se transformando em um compacto simples, com duas músicas completas.

Durante as reuniões da empresa, Lana, ainda jovem e inexperiente, costumava cantar informalmente, encantando os presentes com sua voz. Foi assim que se lembraram dela para a gravação. E, quase de forma espontânea, Lana entrou pela primeira vez em um estúdio, dando vida àquela peça promocional. O impacto foi imediato: a empresa começou a receber inúmeras cartas perguntando quem era a dona daquela voz encantadora.

O retorno não demorou a se transformar em oportunidades. Lana foi convidada para se apresentar na Rádio Iracema, em Fortaleza, onde cantou durante quatro dias consecutivos. Em seguida, realizou uma turnê de dois meses pelo Norte e Nordeste, passando pelas principais cidades da região. Ao voltar para casa, já havia conquistado o reconhecimento e a consagração como promessa da música brasileira.

Sucesso no rádio e na televisão

Sua carreira deslanchou na era de ouro do rádio brasileiro. Participou dos principais programas das rádios Nacional, Mayrink Veiga e Tupi. Com sua beleza e presença marcante, logo migrou também para a televisão, onde participou de atrações como o “Programa do Chacrinha” e o “Clube dos Artistas”, consolidando sua popularidade junto ao grande público.

Lana também foi atriz e chegou a atuar em produções do cinema nacional, como o filme “Com Água na Boca” (1956), do diretor J. B. Tanko, em que interpretou uma cantora. Sua imagem era associada ao glamour da época, e ela soube aproveitar esse prestígio em diversas áreas da arte.

Lana e Mazzaropi
Sua voz começou a ser notada após a gravação de um jingle composto por seu pai, que era militar e poeta, para uma empresa de caminhões.
De nome de batismo, Irlan Figueiredo Passos, nasceu no Rio de Janeiro, em 5 de fevereiro de 1932. Lana atingiu o sucesso nos anos 50 ao interpretar canções como a estrangeira “Little Darling” (Maurice Williams) e “Se Todos Fossem Iguais a Você” (Tom Jobim e Vinicius de Moraes). À época, ficou conhecida como “A Internacional” — pela capacidade de cantar em diversos idiomas. Durante sua vida artística gravou 75 discos, além disso, apresentou programas em emissoras de rádio, tendo passado, inclusive, pelas rádios Tupi (em 1954) e Mayrink Veiga. No cinema participou de importantes trabalhos ao lado de Mazzaropi, a exemplo de “Chofer de Praça”, “Jeca Tatu” e “As Aventuras de Pedro Malasartes”.

Um sucesso que atravessou fronteiras

Entre as várias gravações marcantes de Lana Bittencourt, uma canção em especial ganhou destaque nacional e internacional: “Little Darling”. Com uma interpretação envolvente e um inglês impecável, Lana conquistou o público brasileiro, emplacando o disco entre os mais vendidos por várias semanas. O sucesso foi tão grande que despertou o interesse do mercado norte-americano, levando a cantora a viajar aos Estados Unidos para participar da apresentação oficial do disco naquele país.

Naquela época, esse tipo de reconhecimento era algo inédito. Um feito ainda mais simbólico, considerando que se tratava de uma música originalmente gravada por americanos, agora sendo relançada nos Estados Unidos na voz de uma artista brasileira. A repercussão foi celebrada pela Revista do Rádio, que em 1959 escreveu: “Até gravar ‘Little Darling’, Lana Bittencourt era apenas uma boa cantora. Mas como o disco foi para as paradas de sucesso, começou a ser solicitada para viagens e ganhou fortuna, fama e cartaz.”

O impacto da gravação foi tão forte que Lana encerrou o ano como a cantora mais bem cotada da temporada, ocupando o topo entre as vozes femininas do disco. Esse momento marcaria para sempre sua trajetória artística, abrindo portas e consolidando seu nome como um dos principais da era de ouro da música brasileira. Abaixo, a gravação original de Lana para “Little Darling”.

Bittencourt foi uma das estrelas do rádio e também uma das pioneiras do rock no Brasil. Do rádio foi para o disco, formato no qual estreou em 1954 (na gravadora Todamérica) para, no ano seguinte, assinar com a Columbia, onde gravou boleros, tangos e outras canções de sucesso em inglês e espanhol.
Algumas das lendas da Jovem Guarda ainda eram crianças, ou adolescentes, e Lana já mandava muito bem com a música que foi uma das primeiras aparições do rock no mercado fonográfico nacional: “Little Darling”, do gênero “calypso”, foi um estouro. Esse hit, gravado nos EUA pelo The Dimonds, um grupo de Doo Woop, fez tanto sucesso na voz de nossa rainha do rádio que, em 1957, ela vendeu 700 mil discos graças ao sucesso da canção. A direção da gravadora Columbia comemorou. Ainda nesse ano, emplacou o baião “Zezé” (Humberto Teixeira e Caribé da Rocha). No mesmo ano, gravou um de seus maiores sucessos, o samba-canção “Se alguém telefonar”, de Jair Amorim e Alcyr Pires Vermelho, que, mais tarde, foi incluído no álbum “LANA EM MUSICALSCOPE”.

A artista não ficou presa aos anos dourados, interrompeu a carreira ao final da década de 1960 para cuidar da família e em 1977 retornou, cantou obras dos famosos compositores da MPB, fez vários shows e sempre foi acompanhada de perto pelo público fiel. Lana foi uma cantora de voz envolvente e interpretação passional, poderosa, afinada e intérprete maior. Suas gravações foram presentes que o mercado fonográfico concedeu aos amantes da boa música, desde os 78 RPM, nos anos de ouro do rádio.  No vídeo abaixo, sua brilhante interpretação para o clássico “Se Todos Fossem Iguais a Você”, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes. 

Os últimos anos e a sua despedida

Mesmo longe das paradas de sucesso, Lana nunca deixou de cantar. Participava de programas de rádio, fazia shows para públicos nostálgicos e manteve uma base fiel de admiradores. Sua trajetória foi marcada por discrição, mas também por uma elegância constante.

Lana Bittencourt faleceu no dia 28 de agosto, de 2023, aos 91 anos, em Petrópolis, no Rio de Janeiro. Sua morte comoveu fãs, músicos e apresentadores que cresceram ouvindo sua voz potente.

Pouco antes de partir, chegou a gravar entrevistas onde refletia sobre sua trajetória e afirmava que “a música é o que sustenta a alma”. A cantora deixou um legado musical que continua a encantar gerações.

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