O intérprete que vendeu milhões de discos e emocionou o Brasil
Estas são as viagens da Nave Saudade, em sua missão de 15 anos para a exploração de novos mundos, para pesquisar antigos discos, audaciosamente indo ao tempo dos 78 RPM (rotações por minuto). Nosso mergulho nos levou ao show de calouros radiofônico, final da década de 1930, quando o exigente apresentador Ary Barroso reprovou o nosso herói Nelson, sugerindo-lhe, inclusive, que desistisse da música e que voltasse a trabalhar como garçom. Felizmente, ele insistiu e o mercado fonográfico brasileiro ganhou um intérprete com vasta capacidade vocal.
Antônio Gonçalves Neto, ou Nelson Gonçalves, como ficou conhecido, nasceu em Santana do Livramento, Rio Grande do Sul, em 21 de junho, de 1919. Ainda criança, mudou-se para São Paulo, mas foi ao fim da década de 1930, ao chegar no Rio, que começou a lutar pelo sonho de seguir carreira artística. Desde o samba de estreia, “Sinto-me bem” (1941), de Ataulfo Alves, até às últimas gravações, manteve-se fiel ao estilo marginal romântico, cantando músicas de forte apelo popular, como “Fica Comigo Esta Noite”. O cantor também foi jornaleiro, mecânico, polidor, engraxate, garçom e lutador de boxe.
Amado pelos fãs, lá pelos idos anos 1940, foi considerado o sucessor de Orlando Silva. Nelson superou problemas com drogas entre as décadas de 50 e 60 – período em que viveu um momento especial em sua carreira. Próximo ao fim de sua vida, continuou vendendo a média de 100 mil discos por ano. Gonçalves nunca se considerou um fenômeno. Certa vez, falando de seu cantor preferido, definiu-se modestamente: “Sinatra sim, é um verdadeiro fenômeno. Eu não. Sou um cantor como outro qualquer”. Entre os maiores sucessos da carreira do artista estão: Maria Bethânia, Último desejo, Fica comigo esta noite, Naquela Mesa, Normalista e A volta do Boêmio. Ganhou inúmeros prêmios. Nelson Gonçalves é o segundo maior vendedor de discos da história do Brasil – bateu 81 milhões de cópias e ficou atrás apenas de Roberto Carlos, com 120 milhões. Amado por várias gerações, seu maior sucesso foi a canção A volta do boêmio, composta por Adelino Moreira, em 1957.
Nelson Gonçalves entrou na fase negra de sua vida no dia 5 de maio de 1966, quando fora preso em flagrante, em casa, diante dos próprios filhos como viciado em droga. Alguns dias depois, a direção do presídio recebeu um abaixo assinado dos 3.000 presidiários, onde eles pediam que suas penas fossem aumentadas em um dia cada um, e que em troca Nelson Gonçalves fosse libertado. Durante o banho de sol, naquele dia, mais de 3.000 vozes emocionadas dos presidiários entoavam ‘A Volta do Boêmio’, que de forma dramática, ecoava pelos corredores tristes do presídio.
Silvio Santos ao ser informado da volta de Nelson, disse ao seu pessoal do SBT: ‘Se o Nelson voltou a cantar, contratam o homem. Não estamos aqui para julgar ninguém. É o maior cantor do Brasil’. Com isso tornou-se um dos poucos a lhe estenderem a mão.
Passado o período de maior turbulência pessoal, o artista voltou a gravar, fazer shows e a conquistar muitos fãs, apesar de todas as histórias que propagavam contra ele. Nelson Gonçalves (1919-1998) deixou como herança uma carreira marcada por sucessos estrondosos, mas também uma série de relatos duvidosos a seu respeito. “Criou-se um mito em torno do Nelson”, contou, em 2002, o escritor Marco Aurélio Barroso, autor de A Revolta do Boêmio – A Vida de Nelson Gonçalves, em que mais retifica que ratifica as informações sobre o cantor. “O problema é que ele mais ajudou a alimentar que destruir as falsas histórias, por ser uma pessoa muito insegura” – Escreveu Barroso. Os fãs não ligam para a vida pessoal do astro que bateu recordes, foi rei do rádio e se consagrou como uma das vozes mais bonitas do Brasil. Faleceu aos 78 anos, em 18 de abril de 1998, no Rio de Janeiro.