O ano era 1956, lembro-me como se fora hoje… Juscelino, que eu gostava de ver dançar, estava no Palácio, preocupadíssimo com sua louca ideia de fazer 50 anos em 5. Muito a fazer! E por falar nisso, outra que em curto espaço de tempo correu para deixar seu recado, foi a maravilhosa Dolores, a quem eu chamava carinhosamente de Dodô. Evidente que não era nascido, mas gosto de imaginar, como se fora. Ah! Que mulher fantástica! Sempre à frente do seu tempo, tinha uma alma poética, um coração apinhado de inspiração. Ela amou com devoção a arte de cantar, transpirava notas musicais em seus poros e no corpo frágil que tão cedo a levaria de nós. No entanto, ela não ia com calma. Sabia que teria pouco tempo de vida, então, foi com tudo e viveu com intensidade todas as emoções que a enfermidade lhe permitira. Escreveu alguns dos registros mais célebres do nosso cancioneiro, encantou o Brasil com as músicas preciosas que continuam sendo ouvidas, regravadas e que nos fazem sonhar.

Dolores Duran e João Donato

Juscelino Kubitschek tocava os planos, que incluíam construir a capital do País, e Dolores encantava aonde ia – inclusive na Rádio Nacional – com sua interpretação visceral, apaixonante e com a voz cativante que dava vida às letras de suas melodias. Algumas de suas canções: Castigo, Estrada do Sol (com Tom Jobim), Fim de Caso, Por Causa de Você (com Tom Jobim), Solidão, Ternura Antiga (com Ribamar), A Noite do Meu Bem, e muitas outras pérolas foram escritas por ela. Mulata pobre, suburbana, pequena e com bochechas que se destacavam, tinha um talento mais que perceptível: era desembaraçada, bem-humorada, inteligente, possuía simpatia sem igual, cantava em várias línguas e era respeitada pela intelectualidade.

 

Presidente Kubitschek chora em 1960 após inaugurar Brasília.


Dodô nasceu aqui no Rio de Janeiro, no dia 7 de junho de 1930. Poucas vezes passou pela música popular brasileira uma mulher tão sensível. A cantora tinha um problema cardíaco, advindo de uma enfermidade da infância. Faleceu com apenas 29 anos, em 24 de outubro de 1959. Um ano depois, em 1960, foi inaugurada Brasília, nossa capital. Emocionado, durante a missa, o presidente chorou. Não posso esquecer: Kubitschek, famoso “Pé de Valsa”, faleceu dezessete anos depois da partida de Duran. Entre as manias que eu tenho, uma é gostar de Dolores.

 

Dolores Duran – Disco Estrada da Saudade


Dolores Duran – Por Causa de Você

Composição: Tom Jobim e Dolores Duran